É importante iniciar observando algumas definições e considerações clássicas acerca de “milagre”.Geisler (2010, p. 40) afirma que na perspectiva histórica os teólogos têm definido os milagres de duas maneiras distintas, em sentido rígido ou moderado. Os moderados seguem a linha de Agostinho (354-430), que descreve o milagre como sendo “um prodígio [que] não é contrário à natureza, mas contrário ao nosso conhecimento da natureza” (Cidade de Deus, 21.8). O sentido rígido é creditado àqueles que seguem a linha de Tomás de Aquino, que compreende o milagre como um evento que vai para além dos poderes da natureza e que somente poderia ser produzido por uma força sobrenatural - Deus. (Summa Contra Getiles, Livro 3).Champlin (2001, p. 266), ao comentar sobre a perspectiva de Agostinho sobre os milagres escreve:Agostinho argumentava fortemente em prol da naturalidade dos milagres, do ponto de vista de Deus, apesar de parecerem sobrenaturais ou contrários à natureza, do nosso ponto de vista. Deus parece contradizer ou quebrar alguma lei natural, mas ele simplesmente aplica alguma lei superior, anulando outra lei, inferior. Há uma suprema lei na natureza, dentro da qual todos os milagres podem ser ajustados. O argumento filosófico-teológico dessa abordagem é que Deus, que estabeleceu as leis naturais, jamais agiria contrariamente a Si mesmo, quebrando, ocasionalmente, e por motivos especiais, essa lei (Contra Faustum, 26.3).Referindo-se indiretamente ao pensamento de Tomás de Aquino, Champlin comenta que outros teólogos não percebem problemas no fato de que Deus pode quebrar leis naturais em suas intervenções. Para Champlin esta discussão é fútil, visto que a natureza fragmentar de nosso conhecimento e da ciência não pode chegar a uma definição decente (plena?) do natural, e muito menos do sobrenatural.Para Strong (2002, p. 185-186):Milagre é um evento na natureza em si mesmo tão extraordinário e tão coincidente com a profecia ou a determinação de um mestre religioso ou um líder que garante plenamente a convicção da parte dos que o testemunham que Deus o operou com desígnio de certificar que o mestre ou líder foi comissionado por ele.
Em sua Teologia Sistemática, Augustus H. Strong aborda ainda questões relacionadas com a possibilidade do milagre, a probabilidade do milagre, o testemunho necessário para provar um milagre, e força evidencial dos milagres. Recomendo a aquisição e a leitura da obra de Strong.
INTRODUÇÃO
Eliseu, o sucessor de Elias, operou muitos milagres, o fundamento para a realização de tais maravilhas estava no seu relacionamento com Deus. Na lição de hoje mostraremos que Eliseu foi, verdadeiramente, um profeta de Deus. Em seguida, destacaremos os diferentes tipos de milagres por ele realizados. Ao final, enfatizaremos que o Deus, que a fonte genuína dos milagres, continua o mesmo, e, dependendo dos Seus propósitos, pode fazer milagres ainda hoje.
1. ELISEU, UM PROFETA DE DEUS
Eliseu foi um profeta de Deus, seu nome significa “Deus é salvação”, ele era filho de Safate. Ele foi ungido profeta por Elias em Abel-Meolá, enquanto lavrava a terra com doze juntas de boi. Naquele lugar Elias lançou sobre ele o seu manto, passando adiante (I Rs. 19.19). Eliseu serviu Elias até o momento em que este fora transladado da terra. Aquela também foi a ocasião que Eliseu apanhou o manto caído, recebendo, do Senhor, porção dobrada do espírito de Elias, tornando-se, assim, o herdeiro profético do seu senhor (II Rs. 2). Após o translado de Elias, Eliseu passou a ser usado maravilhosamente por Deus, realizando muitos milagres, um dos primeiros foi a separação das águas do rio Jordão, usando o manto do seu mestre (II Rs. 2.14). Isso provavelmente fez com que os discípulos dos profetas reconhecessem publicamente Eliseu como o sucessor de Elias. Logo em seguida Eliseu realizou outros milagres, dentre eles, a dulcificação das águas de Jericó (II Rs. 2.19-22) e o aparecimento de ursos que destroçaram os jovens escarnecedores (II Rs. 2.23,24). Posteriormente o rei de Moabe, que havia pagado tributo ao rei Davi, se revoltou contra Israel, com a pretensão de invadir Israel. Os reis de Judá e Edom seguiram para o deserto, a fim de surpreender o rei de Moabe, mas faltou água. Josafá faz um pedido a Eliseu e este providencia um grande livramento (II Rs. 3.1-25). Não há uma cronologia detalhada na Bíblia da vida de Eliseu, sabemos tão somente que ele morreu no reinado de Joás (II Rs. 13.14). Ele morreu na sua própria casa, depois de sessenta anos de atuação profética, na idade de 90 anos (II Rs. 13.14-19).
2. OS DIFERENTES MILAGRES DE ELISEU
A vida de Eliseu foi marcada por milagres, todos eles com propósitos específicos, delineados pelo Senhor. Isso pode ser percebido na providência e auxílio do Senhor no caso da viúva, cujo marido havia vivido no temor ao Deus de Israel (II Rs. 4.1-7). A pobreza na qual aquela mulher se encontrava motivou o profeta a realizar o milagre para prestar auxílio à viúva desamparada. Elias sempre que possível ficava hospedado em casa de uma piedosa família israelita. A mulher sunamita, que o hospedava, não tinha filhos, sendo isso considerado uma grande desgraça para aquela família. Certo dia o profeta afirmou que Deus reverteria aquela situação, dando filhos àquela mulher (II Rs. 4.8-17). Essa mulher, então, teve um filho, que, após alguns anos, morreu em virtude de um ataque de insolação. A mulher deitou o filho sobre a cama e partiu em busca do profeta, que orou, fazendo com que o menino voltasse a viver (II Rs. 4.26-37). Tempos depois desse acontecimento, houve grande fome em Israel, Eliseu estava em Gilgal, na escola dos profetas. Naquela ocasião colocaram uma planta venenosa na panela, mas o profeta fez com que aquela planta se tornasse inofensiva, a partir da mistura de farinha (II Rs. 4.38-41). Próximo aquele tempo aconteceu outro milagre, o dos vinte pães e algumas espigas de trigo. Em II Rs. 5 há o registro do milagre da cura de Naamã, que era um homem notável na Síria, mas que se encontrava leproso. Ele veio a Israel, por indicação de uma menina judia, para pedir cura, sendo curado por Eliseu. Certa vez um machado emprestado caiu na água, mas Eliseu, vendo a apreensão do momento, recuperou o machado, fazendo com que esse flutuasse na água (II Rs. 6.1-7).Há também o registro de um milagre em que o rei Jeorão acusa Eliseu de ser a causa de suas adversidades, e manda mata-lo. Mas Eliseu tomou as precauções necessárias, e, para não ser morto, realizou um milagre de abundância de alimentos (II Rs. 7).
3. OS MILAGRES DO DEUS DE ELISEU
Eliseu realizou muitos milagres porque Deus era com ele, confirmando seu ministério profético. Cada um daqueles milagres tinha uma razão de ser, Deus tinha propósitos na realização daqueles feitos maravilhosos. Não podemos esquecer-nos desse importante detalhe, caso contrário, transformaremos Deus em um mero “fazedor de milagres”. É perigoso se aproximar de Deus apenas com vistas a realização de milagres. Em muitos contextos evangélicos atuais as pessoas querem apenas a liberação, mas esquecem do Libertador. Deixam de atentar para o fato que o maior milagre é a salvação de uma alma. No Evangelho segundo João lemos que Jesus realizou muitos milagres, mas um deles, geralmente esquecido, é o da libertação da mulher flagrada em adultério. Como pentecostais que somos, acreditamos no poder de Deus, na realização de milagres e maravilhas. Mas é preciso ter cautela para não fazer com que as pessoas se transformem em meros “consumidores” de milagres. No lastro das igrejas pseudopentecostais, corremos o risco de oferecer um produto que, definitivamente, não temos o controle sobre ele. Deus é o Senhor, Ele é soberano, faz como Lhe apraz. Como Ele ainda é o mesmo, podemos testemunhar milagres ainda hoje, mas não podemos, como quis fazer Geazi (II Rs. 5.20-27), tirar vantagens próprias com os milagres de Deus. Essa “síndrome de Geazi” está solapando o movimento evangélico brasileiro. Os milagres estão se tornando um fim em si mesmo, ninguém mais quer pregar salvação e santificação. Estamos testemunhando uma geração de “viciados em milagres”, que não querem ver a face de Deus, apenas as suas mãos.
CONCLUSÃO
Deus realizou grandes e maravilhosos milagres através da vida de Eliseu. Mas todos eles tinham propósitos definidos pelo Senhor, dentro de determinado contexto. Isso nos deixa a lição para que não venhamos a instrumentalizar os milagres em benefício próprio. Toda glória deve ser dada ao Senhor, Ele, e somente Ele, é digno de adoração e louvor. Tenhamos cuidado com os cultos às celebridades, Elias e Eliseu foram servos do Deus Altíssimo, eles passaram, mas a obra do Senhor continua.
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